Tivemos tão pouco tempo, tão imaturos fizemos uma
casa, conhecemos horrores, nos enganamos sobre nós mesmos, um amargo gosto que
ficou, fomos a lugares. E estranhamente, ainda não sei se você preferia água
gelada ou fresca, Godard ou Truffaut.
Um show de uma cantora em Bh, eu triste por estar
passando por um termino. Havia sido apresentada a um curso numa escola de
teologia que trazia um tipo de revolução calvinista e leitura da cultura, e
você não sabia nada sobre o autor de crônicas de Narina, você estava no lugar
certo, e era nosso primeiro ensaio de uma dança que logo aconteceria. Com
camisa jeans, salvo engano e uma cara meio menino bagunceiro, meio príncipe uma
coisa desculpando a outra, bati os olhos nos seus e ali fiquei pensando quem,
afinal, era você.
Ok, eu te achava bonitinho, mas isso era o
de menos: o que realmente me desafiava era a sua fama de esquisito. E aquela
gargalhada que você me tirava quando me ligava por horas. Sim, você tinha fama
de esquisito, não vem dizer que não sabia. Essas famas, aliás, no plural: alternativo,
mulherengo, viado, religioso. Eu te achava pretensioso e confiante, embora tudo
isso estivesse disfarçado de simplicidade, o que tornava tudo mais enigmático.
Eu realmente não te decifrava.
É verdade que você viajava muito, falava
muito, o que eu achava uma graça de tão ingênuo. E me ouvia. Você me ouvia. E
não fazia ideia de como tantos traumas iam nos atropelar mais pra frente, por
conta daquelas historias e lacunas e medos.
Essa era a melhor parte, você estava ali me
ouvindo e se ouvindo e Deus nos ouvindo. E a gente respirava tão de pertinho e
ali não cabia nenhuma maldade, e era tudo uma outra frequência e seguro.
Admito que estar sempre lendo livros enormes e não tinha ninguém que me
ouvisse sobre eles a não ser você e não
era nada sensual como as outras garotas, eu não sei nada sobre sensualidade, e falávamos
sobre qualquer assunto no twitter e isso pesou pra que em uma semana eu
mudasse a sua classificação de cantor-de-igreja-que-canta-e-finge-que-entendeu-agnusdei pra
cantor-que-quer-um-dia-cantar-tudo-e-entender-angnusdei.
O que mudou tudo. Você não fazia ideia.
A questão é que ficamos meio amigos. Meio
porque não dava pra ser inteiro. Com aquela respiração tão de pertinho doce e
quente. Meio porque assim conseguimos
suspender um encontro que só aconteceria três anos depois, quando eu te
convidei pra passar um tempo em Beagá, comigo falado sobre seu termino, em um
bar de rua, onde o maior sinal da folia era a nossa alegria em estar. E você
nem ai. E eu pude enfim me apaixonar, totalmente Colombina.
Peça de venda
Eu estava recém-separada e com aquele
discurso cafona de não querer nunca mais. Mas aí você começou a jogar sujo, e
fez coisas terríveis e imperdoáveis, como brincar com o meu filho e saber sobre
as coisas mais escondidas dentro de mim e não me julgar. E eu fui te estudando
desesperadamente pra descobrir seus defeitos, porque não era possível alguém
acordar bem-humorado e ainda por cima fazer a capela das minhas musicas
favoritas. Ter coisas tão difíceis e ser doce. E assim eu fui ficando... uma semana, um mês,
anos.
E assim você foi embora. Num terror absoluto. Igual a musica “Olhos nos Olhos”,
eu quase morri, adoeci de uma mistura de todos os sentimentos, fora a doença
que eles acharam para explicar o tudo que havia sido ate ali, um pouco de magoa, tristeza e muita dor, disse
que preferia me ver no caixão, ou te ver no caixão do que ter que estar viva
pra te ver morrer na minha vida e vice e versa (..cantei mil vezes a Vultures e
ainda não era aquilo que eu queria dizer, era ainda pior ) mas como aquela musica
“Ele é” dos Arrais, levantei e fui viver.
Posso te pedir uma coisa?
Levanta também, não fica com ódio mais. Nem chora escondido porque desde o
tempo em que respirávamos de pertinho eu reconheci que você era mais do que meu
amigo, mas meu irmão de vida. Me perdoa. Não existe nada mais cafona que
escutar musica para alfinetar o coração de alguém porque você mesmo não soube
amar. Digo isso e penso em mim também. É bobo e mantém um vinculo de rancor
completamente desnecessário. Amargura vira doença. Serio, meio que ta na
Bíblia, na oração do Pai Nosso.
Os dias vão passando e eu percebo que
tivemos uma vida, fizemos uma casa, um amor, (um amor
tipo Everything do Michael Bublé ) conhecemos alguns lugares. Mas
eu, estranhamente, ainda não sei se você prefere água gelada ou fresca, Godard
ou Truffaut, praia ou serra. Pagode ou o que. Eu também não sei nada sobre mim.
Você não sabe nada sobre. Não importa mais.
Nosso lado B acabou aparecendo, não era tão
perfeito como aparentava: a versão que sabia que jamais poderia ser perfeito,
mas tentava ser como Jesus, conforme intuíamos, era uma peça de venda.
E aí eu me apaixonei ainda mais. E a paixão virou amor e amizade e tudo
quebrado. Mas voltando, de mãos dadas e tão doente, doente cri, achei
que fosse ser um lar um pro outro, eu
sou frágil e nunca tive coragem e o seu colo era o meu lugar, e foi só dor por
cima de outras novas dores.
Você acha que sabe tudo, o que é
irritante. Você canta, não só em casa, mas no carro, em cima do Julian
Casablancas, sem nem saber quem ele é, uma heresia. Só escuta radio popular.
Você vira os personagens das suas musicas, não importa se é um canalha
sentimental ou um monge, e o mundo que se adapte. Você é irritadinho no
trânsito, do tipo vingativo. Você é um príncipe quando quer, um ser que quer
conversar só muito depois das nove da manhã. E o pior: você gosta de
ar-condicionado. Tem a
ponta dos dedos gordinhos.
Mas por que escrevo tudo isso, pequenezas
particulares que não interessam a ninguém? Ah, sim, porque essa semana (salvo
engano) fez aniversario daquele dia da Marcela Tais em que eu te vi, e
eu queria te dizer uma coisa seriíssima.
É que te amo, serio igual o livro quatro
amores me ensinou, mas eu também não gosto de você, daquele você, e daquela eu
e não sei se existe alternativa pra isso, minhas expectativas trouxeram lembranças
de dor e morte. Nunca vamos saber se estávamos certos ou errados, você não confia em si
mesmo, então como vai confiar em alguém alem do seu umbigo. Como vai conseguir
doar o poder? Eu tenho um baita medo do “seu desejo será para... e ele te
dominará” eu não entendo nada sobre isso. NADA. Porque não falou que não queria
nos? Antes de virarmos nós. Me desculpa.
Se você quiser renovar a vida e fingir que não existiu nada daquela dor, que
foi tudo minha culpa, pode contar
comigo, eu finjo.
Eu só gostaria de manter o respeito e a alegria leve. Tem perdão de pecados e
justificação disponíveis. Tem Romanos e Cinema...Godard ou Truffaut
Não ria da minha ingenuidade. Eu não rio da sua.
uma musica linda nesses dias; Djavan cantando Correnteza.
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